Entidades criticam projeto de Redução do Custo Brasil

27/09/2021
O documento contém uma série de proposições que denotam desconhecimento e descaso em relação à legislação ambiental. 

O Ministério da Economia enviou um ofício denominado “Projeto de Redução do Custo Brasil” ao Ministério do meio Ambiente (MMA) com o objetivo de transformar a produtividade e competitividade do País. O documento contém uma série de proposições que denotam desconhecimento e descaso em relação à legislação ambiental. 

O MMA repassou o documento ao Ibama para que o órgão ambiental respondesse aos pleitos até 30 de setembro. As medidas "devem eliminar dificuldades estruturais, burocráticas, trabalhistas e econômicas que elevam o custo de se fazer negócios no Brasil, comprometendo investimentos e encarecendo os preços dos produtos nacionais". Entre as proposições, estão: extinguir a lista do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) que define casos em que se exige o estudo prévio de impacto ambiental (EIA); prever a concessão de licenças por decurso de prazo, em razão da demora na análise dos pedidos de licenciamento ambiental; revogar as regras sobre autorização de supressão de vegetação nativa que se aplicam especificamente ao bioma Mata Atlântica, bem como reduzir a participação do Ibama nesses processos autorizativos; dispensar de licenciamento ambiental a reutilização de rejeito e estéril de mineração; alterar o mapa de biomas do IBGE, excluindo da delimitação da Amazônia as áreas com características de Cerrado; cancelar a consulta ao Iphan para empreendimentos agrossilvipastoris; e reduzir as exigências para fabricação de agrotóxicos voltados à exportação, com o objetivo de tornar o país um polo produtor de agroquímicos.

Representantes de organizações da sociedade civil divulgaram manifesto de repúdio a mais uma medida do governo Bolsonaro de burlar a legislação ambiental. "A proposta do Ministério da Economia, que está sendo levada adiante pelo Ministério do Meio Ambiente como se fosse um despachante, inclui licenciamento por decurso de prazo, dispensa de licença para aproveitamento de rejeito de mineração, redefinição do tamanho da Amazônia, incentivo ao Brasil de virar polo global de produção de agrotóxicos, entre outras medidas que nos levarão a cavar ainda mais o fundo do poço. O governo afirma que são demandas apoiadas pelo Movimento Brasil Competitivo, que tem em seu conselho representantes de empresas como Amazon, Microsoft e Google. Governo e iniciativa privada estão devendo explicações sobre esse absurdo”, disse Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima. Ele acrescenta que o Ministério de Paulo Guedes propõe o ecocídio ao Brasil com mais um ataque à Mata Atlântica. “Na contramão do que o mundo busca para enfrentar a emergência climática, do que precisamos para minimizar a crise hídrica e energética, o projeto de Redução do Custo Brasil é a maior ameaça à sustentabilidade do país. Ao atacar a Lei da Mata Atlântica, de forma explícita, o documento do Ministério da Economia deixa evidente que a condução da boiada sobre a proteção do meio ambiente é uma estratégia desastrosa e retrógrada do governo brasileiro”. 

Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da SOS Mata Atlântica, afirma que a Lei da Mata Atlântica é uma conquista da sociedade e é estratégica para o futuro do Brasil por promover o uso sustentável do bioma e garantir, com a proteção da floresta, os serviços ambientais essenciais para a vida — como a água —, para a saúde da população e para as atividades econômicas. “Os danos desse falacioso projeto de redução do Custo Brasil podem ser irreversíveis. Não vamos permitir. Fora boiada”. 

Para Thaís Bannwart, porta voz de políticas públicas do Greenpeace Brasil, o governo federal vê a preservação ambiental como entrave para o desenvolvimento econômico, visão essa com cara de século passado e em desacordo com o restante do mundo, que já entendeu que sem meio ambiente preservado não há futuro possível para a humanidade. 

"A proposta do Ministério da Economia, além de assustadora, traz comandos contraditórios. Num trecho, sugere que não exista mais uma regra nacional que defina que tipo de atividade poluidora deve ser previamente licenciada, liberando cada estado para decidir como quiser — o que pode levar o país a ter 27 regras diferentes. Em outro trecho, sugere mudança na lei para criar a obrigatoriedade de regras ambientais uniformes no país. Não sabem do que estão falando, comenta Raul Silva Telles do Valle, diretor de justiça socioambiental do WWF Brasil. 

Já André Lima, consultor do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), afirma que a notícia do pacote antiambiental de Guedes é bem mais crível do que o discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU. “Coerente com o que Jair Bolsonaro, Salles e tropa vêm fazendo com nossa política ambiental. "O documento reforça o caráter irresponsável e o desespero do atual governo. O crescimento pífio da economia brasileira, a perda de produtividade e de competitividade não são culpa da legislação ambiental do país. Este tipo de ato, em desrespeito às leis e ao Congresso Nacional, só mostra que o que temos hoje é uma gestão criminosa do meio ambiente”, diz Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

Adriana Ramos, coordenadora do Instituto Socioambiental (ISA), comentou que em 2019 – durante jantar com lideranças internacionais – Bolsonaro disse aos presentes que o sentido de seu governo não era construir coisas para o povo brasileiro, mas desconstruir. “Esse projeto estrutura o sentido do governo. Especialmente, no que diz respeito às questões socioambientais, ele é o mapa do caminho do desmonte”. "Chega a ser irônico, para não dizer assustador, que queiram alterar o Mapa de Biomas do IBGE, de 2019, para fazer da Amazônia com caraterísticas de Cerrado, o mesmo que estão fazendo com o Cerrado. A intenção clara é anistiar o desmatamento ilegal na região, aplicando a mesma legislação frouxa que temos para as áreas de reserva legal no Cerrado, onde apenas 20% da vegetação nativa tem obrigação legal de ser mantida em pé”, disse Guilherme Eidt, assessor em políticas públicas do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).