ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

Pesquisador realiza estudo em Recife e SP

16/03/2016

O pesquisador Ricardo Hirata, do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas (Cepas-USP) do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo, realizou dois estudos sobre a utilização das águas subterrâneas nas Regiões Metropolitanas de São Paulo e Recife. O “Projeto Coqueiral: desafios associados à qualidade da água em Recife: como enfrentar a contaminação e a salinização das águas subterrâneas sob a perspectiva de mudança ambiental global e seu contexto social” contou com apoio da Fapesp em Recife. Hirata diz que a perfuração indiscriminada de poços e o consumo excessivo estão levando os aquíferos da Região Metropolitana de Recife ao limite de uma salinização irreversível. “Na contabilidade oficial, a água subterrânea atende a 13% do abastecimento público da Região Metropolitana de Recife. Mas quando consideramos os 14 mil poços existentes na região, que cobrem as falhas no fornecimento público, descobrimos que esse número está subestimado. A água subterrânea atende de fato a 28% do consumo”,

Já o estudo sobre São Paulo foi publicado por Hirata e colaboradores na Revista DAE, mantida pela Sabesp. “Água subterrânea para abastecimento público na Região Metropolitana de São Paulo: é possível utilizá-la em larga escala?” mostra que aquíferos da RMSP poderiam, com baixo investimento e prazo relativamente curto, proporcionar um aporte adicional de 1 metro cúbico de água boa por segundo, mas encontram-se subutilizados.

Para Hirata, em Recife diversos poços foram perfurados sem critérios técnicos e sem controle por parte da administração pública. “Em consequência disso, os aquíferos encontram-se agora seriamente ameaçados, com intrusão de água do mar e início de salinização. Se persistir o ritmo atual de bombeamento, os aquíferos poderão estar irremediavelmente perdidos por volta de 2035”, prosseguiu o pesquisador. Segundo Hirata, o Projeto Coqueiral foi um grande desafio, pois integrou estudos nas áreas de geologia, hidrogeologia, macrossociologia (urbanização e política institucional de gestão da água), mesossociologia (percepções e participações coletivas no manejo da água) e microssociologia (práticas individuais relativas ao uso da água). Muitas informações sobre o passado remoto, relativas à evolução do nível do mar ou às variações do clima regional, ficaram registradas nas águas subterrâneas. E foram recuperadas por meio de miríades de análises. As águas subterrâneas de Recife estão distribuídas nos aquíferos de Boa Viagem: pouco profundo e livre, vulnerável à salinização e à contaminação, amplamente utilizado pela população pobre; Beberibe, um aquífero profundo e confinado, usado no abastecimento público e industrial; e Cabo, outro aquífero profundo e confinado, usado no abastecimento privado residencial da população de maior poder econômico.

Já na Região metropolitana de São Paulo há dois estoques de águas subterrâneas: o aquífero sedimentar, localizado em áreas em que o relevo é mais suave; e o aquífero cristalino, que se estende abaixo do aquífero sedimentar e aflora em locais onde o relevo é mais acidentado. “É essa água subterrânea que também dilui os esgotos lançados nos rios, sustenta a vida aquática e recarrega os reservatórios superficiais de abastecimento público em épocas de estiagem”, informou Hirata. Nas áreas de baixa ocupação urbana a recarga natural acontece com as chuvas, enquanto nas áreas mais impermeabilizadas e de forte urbanização as fugas das redes públicas de distribuição, da coletora de esgotos e das galerias pluviais podem representar mais de 50% da recarga dos aquíferos, segundo o estudo realizado.

O volume de água de recarga que se infiltra anualmente nos aquíferos da Bacia do Alto Tietê é estimado em 53 m3/s. Desse montante, 33 m3/s poderiam ser captados de forma segura por meio de poços profundos, sem interferir no fluxo de base dos rios. Tal número é quase a metade da atual capacidade instalada do sistema produtor metropolitano, computada em 67,7 m3/s.

 “O último levantamento, realizado em 2009, estimou a existência de 12 mil poços profundos, retirando dos aquíferos cerca de 10 m3/s. Desse total, apenas 4.931 poços encontravam-se cadastrados no Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE). Em função da estiagem dos anos 2013, 2014 e 2015, o ritmo de perfurações foi intenso, especialmente de poços irregulares. E há várias zonas aquíferas com sintomas de superexploração, o que ocorre quando a taxa de bombeamento é maior do que a capacidade do aquífero, criando prejuízos ao recurso, aumentos intoleráveis aos custos da extração ou impactos ecológicos”, afirmou Hirata.

No artigo citado, o pesquisador e seus colaboradores recomendaram ao órgão gestor que novos poços para abastecimento público fossem construídos em áreas subutilizadas, em especial onde já existe estrutura de adução e estocagem de água tratada, como uma estratégia para minimizar os impactos da crise hídrica.

Segundo as contas dos pesquisadores, 180 poços públicos permitiriam oferecer à população um aporte adicional de um metro cúbico de água por segundo, a um custo para construção, operação e manutenção competitivo em relação ao custo de obtenção de novas fontes de água superficial. “Existe uma falsa percepção de que a água subterrânea da Região Metropolitana de São Paulo é de baixa qualidade devido à contaminação por esgotos, vazamentos de tanques de combustíveis em postos de serviços e infiltração de substâncias químicas em zonas industriais. Mas tais situações restringem-se apenas a determinadas áreas. A água subterrânea, especialmente quando captada nas porções mais profundas do aquífero, é melhor protegida da poluição do que a água dos reservatórios superficiais”, ponderou o pesquisador.