Pequeno avanço, após dois anos do Novo Marco

20/07/2022
Atualmente, o Brasil tem quase 35 milhões de pessoas sem acesso a água tratada e 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto.

O Instituto Trata Brasil e a GO Associados divulgaram o estudo inédito “Avanços do Novo Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil -- 2022 (SNIS 2020)”, onde vêem um pequeno avanço do setor dois anos após a aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento (Lei nº 14.026/2020. Atualmente, o Brasil tem quase 35 milhões de pessoas sem acesso a água tratada e 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto, o que reflete nas centenas de pessoas hospitalizadas por doenças de veiculação hídrica. Os dados do SNIS 2020 apontam que o país ainda tem uma dificuldade com o tratamento do esgoto, do qual somente 50% do volume gerado é tratado -- isto é, mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento são despejadas na natureza diariamente. 

O Novo Marco Legal do Saneamento determina metas para universalização dos serviços até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto; aumento da concorrência pelo mercado com vedação a novos Contratos de Programa; maior segurança jurídica para a privatização de companhias estatais; estímulo à prestação regionalizada dos serviços e criação de um papel de destaque para a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) na regulação dos serviços. 

O estudo destaca dois pontos previstos pelo Novo Marco Legal que ocorreram logo nos primeiros anos - a apresentação da capacidade econômico-financeira para a universalização dos serviços até 2033, principalmente pelas concessionárias estaduais; e a formação de blocos regionais de prestação dos serviços de água e esgotamento sanitário. Dos 3,9 mil municípios que deveriam apresentar a documentação da capacidade econômico-financeira, segundo Decreto nº 10.710/2021, que tinha como prazo 31 de dezembro de 2021, 1,1 mil municípios não apresentaram a comprovação ou foi considerada irregular pelas respectivas agências reguladoras. Cerca de 62% ou 2,4 mil estão em situação absolutamente regular e 325 foram considerados regulares, mas com alguma espécie de restrição. Municípios com capacidade econômico-financeira comprovada são aqueles com melhores indicadores de atendimento de abastecimento de água e de esgotamento sanitário e chegam a investir R$ 50,39 a mais por habitante em relação aos municípios irregulares.

Os municípios com contratos em situação irregular são os que mais precisam despender recursos e investir em expansão de rede visando à universalização. Nestes municípios vivem quase 30 milhões de brasileiros e seus indicadores de atendimento de água e esgoto estão bem distantes da média nacional. A população com acesso à água nesses municípios teria que passar de 64,4% para 99% e a cobertura de esgoto teria que subir de 29,1% para 90% até 2033 para se alcançar a universalização prevista no Novo Marco Legal do Saneamento. A maior parte das cidades em situação irregular está no Norte e Nordeste brasileiro, justamente aquelas que concentram a maioria das companhias estaduais que não apresentaram a documentação exigida pelo Decreto nº 10.710/2021. Por consequência, são estes os estados que concentram a maior parte da população que reside em municípios em situação irregular. Enquanto 13,9% da população brasileira reside em municípios irregulares quanto à prestação dos serviços de saneamento de acordo com o Decreto 10.710/2021, este índice é superior a 60% no Maranhão, Pará e Piauí, chegando a 100% dos municípios nos casos do Acre e de Roraima.

Os municípios têm até 30 de novembro de 2022 para possuírem lei aprovada com regionalizações de saneamento básico estruturadas de três maneiras: Região Metropolitana, Unidade Regional de saneamento básico e Bloco de Referência. Acre, Pará e Tocantins sequer protocolaram Projeto de Lei (PL) junto ao seus respectivos legislativos, enquanto  Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais ainda aguardam a tramitação desses PL junto às suas Assembleias Legislativas.

O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), no Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), vê a necessidade de investimento de cerca de R$ 507 bilhões para se atingir a universalização até 2033, a preços de dezembro de 2020. Os valores não consideram os aportes realizados em 2019 e 2020, que correspondem a aproximadamente R$ 19,9 bilhões e R$ 16,1 bilhões, respectivamente, a preços do mesmo período. Ao subtraírem-se estes investimentos do montante calculado no Plansab, restam ainda R$ 471 bilhões a serem investidos. 

Dividindo o valor para o período entre 2021 e 2033, tem-se uma média de R$ 36,2 bilhões ao ano. Entre os últimos cinco anos disponíveis no SNIS (2016-2020), a preços de dezembro de 2020, o investimento médio equivale a aproximadamente R$ 17,1 bilhões. Isto significa que os aportes anuais precisam mais do que dobrar em todos os anos subsequentes para a universalização ser possível até 31 de dezembro de 2033, conforme previsto no Novo Marco Legal do Saneamento Básico. Segundo o estudo “Quanto custa universalizar o saneamento no Brasil?”, desenvolvido pela consultoria KPMG em julho de 2020, a necessidade de investimento calculada, a preços de dezembro de 2020, é de R$ 993 bilhões, valor bastante superior ao do Plansab. Ao subtrair os investimentos de 2019 e de 2020, obtêm-se R$ 957 bilhões que ainda precisariam ser investidos para se atingir a universalização, um investimento médio anual de aproximadamente R$ 73,7 bilhões entre 2021 e 2033, o que significa que o investimento precisaria mais do que quadruplicar a partir de 2021. O valor investido tem potencial para gerar um aumento na arrecadação tributária de mais de R$ 2,9 bilhões anuais e proporcionar ao mercado de trabalho a criação de 850 mil novos postos de trabalho permanentes. 

Em relação aos leilões, parcerias e concessões, o estudo aponta como caminhos para a ampliação da capacidade de investimento no setor e a utilização eficiente dos recursos públicos. Desde 2020, o BNDES participou da elaboração das licitações de importantes projetos de concessão no setor de saneamento, como o leilão dos blocos 1, 2, 3 e 4 da concessão dos serviços de água e esgoto no Rio de Janeiro, os blocos A, B e C em Alagoas e a concessão dos serviços no estado do Amapá. 

Nos próximos anos, o BNDES prevê a licitação de projetos de saneamento em estados com baixos índices de cobertura dos serviços prestados, como no Ceará, Paraíba e Rondônia. É importante ressaltar que, entre 2016 e 2020, o investimento total em saneamento foi de R$ 86,22 bilhões. O investimento no período de cinco anos demonstra o esforço que ainda precisa ser feito para se alcançar o investimento ideal para universalização.