CRISE HÍDRICA

Para a ANA, faltou planejamento

09/07/2015
Em apresentação na sede da Abiquim, em São Paulo, o Diretor-Presidente da Agência Nacional das Águas (ANA), Vicente Andreu Guillo, disse que, dentre os fatores que provocaram a atual crise hídrica que atinge a região Sudeste estão a seca inédita e a ausência de planejamento e preparação para uma seca deste tipo e a regulação para o setor, questões que foram muito pouco debatidas em 2014, em função do ano eleitoral.
 
Ele fez tais afirmações durante o “Seminário Gestão Hídrica e a Indústria Química”, promovido pela Abiquim para discutir a utilização dos recursos hídricos pela indústria química e ações de melhoria no uso da água no atual momento de crise hídrica. 
 
No atual momento, disse Andreu, a crise hídrica é determinada pela consolidação do El Niño; grande volume de chuvas (acima da média) no Norte e Sul do País, manutenção da seca no Nordeste. Há uma preocupação em especial com o Semi-Árido, já que os reservatórios estão baixos (Sobradinho, 25% e a maior parte abaixo dos 20%). Segundo Andreu, o estado mais avançado em gestão hídrica na região é o Ceará. “Estamos preocupados com essa situação e temos que acompanhá-la”. A obra de transposição do rio São Francisco também é citada como prioridade, senão a situação no Nordeste tende a se agravar com o decorrer dos anos. 
 
Para São Paulo, a tendência é a manutenção do quadro atual para 2015 e 2016; o mesmo cenário constata-se em Minas Gerais, mas com o agravamento de que não há tanta participação voluntária da população em ações contra redução de perdas de água, como é constatado em São Paulo. No Sudeste, a situação menos preocupante a do Espírito Santo. O Sul tem estabilidade, com pequenos reservatórios e chuvas regulares. 
 
Em sua conclusão, Andreu comenta sobre os aprendizados que podemos ter sobre a crise hídrica. Apesar de rico em seus recursos hídricos, o Brasil apresenta uma fragilidade, a necessidade de se construir novos reservatórios, cuidados para se gastar águas subterrâneas – na opinião do Diretor da ANA esses estoques têm que ser tratados como estratégicos - , um padrão de consumo muito elevado pela indústria, a tarifa de água tem que ser cara, além de se definir uma solução para a questão do domínio duplo (Federal e Estadual) de certas bacias hidrográficas. O uso múltiplo da água também precisa ser revisto. 
 
Sobre a regulação dos recursos hídricos, ele comentou que se avançou muito, mas que é necessário criar regulação socialmente aceita em níveis intermediários, que vão desde a outorga até a regulação. Entre as alternativas, Andreu disse que reuso direto é uma opção impossível no Brasil. O reuso indireto e com regulação e a dessalinização, que têm custo mais baixo, são soluções viáveis. A respeito da outorga do Cantareira, é esperada uma renovação para outubro deste ano. Mas, para esta renovação passar a vigorar o Cantareira tem que atingir 20% do volume útil em 2015. A ANA tem um acordo com o DAEE para esta renovação. 
 
O Diretor de Meio Ambiente da FIESP, Nelson Pereira dos Reis, disse que a principal causa da crise hídrica é a falta de planejamento. O Polo de Paulínia foi afetado com paradas de produção, problemas de renovação de licença ambiental. Na região do PCJ, Reis comentou que outorgas estão suspensas desde 2014 e que houve queda de 30% na captação de água. Na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), há o rodízio na rede pública. A FIESP lançou em 2014 a cartilha “Cuide desse bem. Evite o desperdício” para conscientizar a população sobre a importância de não ter desperdício de água, além de distribuir 1,5 milhão de cartelas com 4 redutores de vazão cada e negociações com a ANA e DAEE para implantar medidas de racionamento na indústria. Pereira comenta que “os recursos obtidos com a cobrança da água devem ser voltados para o desenvolvimento de projetos e retornar para investimentos na própria bacia”. 
 
Jorge Peron, Especialista de Meio Ambiente da FIRJAN (Rio de Janeiro), disse que o atual problema do Rio é grave, já que o estado possui apenas um único manancial – rio Paraíba do Sul – que abastece 23 milhões de pessoas em 184 municípios. Cerca de 57% das indústrias fluminenses já desenvolvem ações de redução de água, segundo Peron. No Rio, para Peron, é necessário rever a metodologia sobra cobranças e valores atualmente aplicados pelo estado. Para o especialista também se deve separar planos para saneamento e planos para recursos hídricos. “Deixar tudo em um mesmo lugar é errado”. 
 
O Presidente do CBHRNI - Comitê de Bacias Hidrográficas do Recôncavo Norte e Inhambupe/BA, Sérgio Bastos, disse que os planos são de ampliar o volume de captação em 4,56 m3/s até 2040 com investimentos em infraestrutura nos próximos cinco anos. Entre as obras estão à construção de novos poços, novas barragens, redução de perdas, obras de saneamento e aumentar o volume de Pedra do Cavalo. Apenas o Pólo de Camaçari consome 8 milhões m3/h. Para Camaçari, o CBHRNI  desenvolve ações em parceria com o Governo Estadual, proposta para mudança na lei de recursos hídricos entre outros. Entre os estudos previstos estão : Aquífero São Sebastião (meta para 2018); avaliação de novas tecnologias; Plano da bacia do Recôncavo Norte (meta para 2016) e análise das questões das mudanças climáticas. Bastos disse que no final de 2015 deve começar a cobrança pela água no Recôncavo e melhorias nas redes de monitoramento. 
 
Pela FIERGS, o Especialista em Meio Ambiente Tiago Pereira comentou que o Rio Grande do Sul possui as Regiões Hidrográficas do Guaíba, Litorâneas e do Uruguai. O estado tem ao todo 25 bacias e a do Guaíba atende o maior número de indústrias. Pereira disse que o problema do estado não é da quantidade de água, mas da qualidade da água, já que o Rio Grande do Sul tem três rios em situação crítica (Rio dos Sinos, Rio do caí e Rio Gravataí). “Tem que ter a cobrança pela água. A cobrança impõe uma racionalização do uso” concluiu Pereira, da FIERGS. 
O Deputado Federal Evair de Melo (PV-ES) declarou que deve haver um debate maior que permita responsabilizar o uso da água. O deputado é a favor da tarifa, mas tem que ver como será cobrada. “Ela pode ser tanto federal, como estadual, não importa, mas é necessário um valor para a água que utilizamos para tudo em nossa vida”. 
 
No período da tarde foi apresentado o Modelo de Plano de Contingência para escassez de recursos hídricos, por Luiz Oliveira, Líder América latina de Conformidade Operacional da Dow. O documento serve para ser utilizado como elaboração de um plano no segmento químico industrial, sendo adequado a cada unidade de negócio ou unidade produtiva. Os níveis de contingência devem ser definidos por cada unidade produtiva, ou seja, com base no perfil hidrológico atual da bacia hidrográfica onde a fábrica esteja instalada. Os níveis são divididos em: 
 
  • Verde – O uso pleno dos recursos hídricos está assegurado, ou seja, a unidade produtiva não está sendo afetada; 
  • Amarela – As fontes hídricas que suprem a unidade industrial se encontram em condição que sinaliza que o uso dos recursos hídricos pode ser restringido, ou seja, o risco de parada de processos produtivos devido à escassez da água é provável;
  • Laranja – As fontes hídricas que suprem a industrial unidade se encontram em uma condição que há restrições no uso de recursos hídricos, o que indica parada de processos produtivos devido à escassez iminente:
  • Vermelho – O volume de água das fontes hídricas é insuficiente para atender a unidade industrial instalada. 
 
A unidade industrial é que definirá o nível em que se encontra, com base em redes de informações com representantes de bacias e Secretarias de Meio Ambiente do Estado e do município. As entidades representantes de indústrias podem funcionar como interlocutoras para um melhor diagnóstico das bacias hidrográficas, ajudando assim a definir o nível da unidade produtiva.