ARTIGO

Evolução da Educação Corporativa no Saneamento Brasileiro na Era Hiperdigital

25/09/2018

Por Newton de Lima Azevedo *

Todos nós sabemos que a evolução da tecnologia mudou a forma como os serviços são oferecidos no mundo. Isso é um caminho sem volta, o que é moderno agora pode estar ultrapassado daqui seis meses. O saneamento básico e, principalmente, a capacitação constante de seus trabalhadores de base não pode ficar de fora desse universo digital.

Alguns bons exemplos de setores que tiveram seus produtos e serviços transformados foram: transporte de pessoas, hotelaria e entretenimento. O uso inteligente e eficiente da tecnologia revolucionou a forma de consumirmos esses serviços e produtos. Todos conhecem o Uber, a Netflix e o AirBNB. Apesar das mudanças e inovações tecnológicas, as necessidades das pessoas continuam as mesmas para viajar, se locomover e se divertir. Com o saneamento básico é a mesma coisa, as necessidades das pessoas não mudam e nós precisamos nos modernizar para entregar um serviço de qualidade, satisfatório e universalizado.

O mundo foi integrado as plataformas digitais, tudo está ao alcance e na velocidade de um click no laptop ou smartphone, e não existe mais retorno para isso, quem não se adaptar será atropelado por esse movimento sociocultural que é a “era hiperdigital”. Neste novo cenário cabe a pergunta: Como as grandes corporações estão se adequando para conseguir harmonizar o conhecimento intuitivo, e as vezes intempestivo do frescor dos jovens e a experiência de quem tem anos de estrada?

Hoje as empresas possuem até 5 gerações de pensamento sob o mesmo teto, sendo a mais jovem nascida no início dos anos 2000, que é a primeira geração digital, ou seja, são rápidos em criar soluções para resolver problemas usando tecnologia. A necessidade da sua convivência com aqueles que nasceram entre as décadas de 40 e 60 é o grande desafio das empresas. Estes últimos são rígidos cumpridores de regras, autoritários, habituados ao sacrifício e a deixar a palavra final para quem ganha o maior salário.

Para nós do Saneamento Básico, toda esta transformação chega de forma igualmente revolucionária, num ambiente de alta complexidade, repleto de desafios estruturais, que há anos tentamos superar. Cabe lembrar que, independente de toda modernidade em se transformar as coisas, as necessidades essenciais não mudam, ou seja, todas as pessoas continuam necessitando de saneamento de qualidade seja qual for o nível tecnológico em que a sociedade se encontra. O saneamento é pré-requisito para a saúde e existência da vida e o acesso à tecnologia está ao nosso alcance para nos ajudar.

Gosto de exemplificar, contando uma experiência pessoal. Há aproximadamente 40 anos, quando eu era responsável pelo projeto da Casa de Força da Usina de Itaipu, surgiu a necessidade de extrema urgência para se enviar um desenho complementar para a concretagem de uma peça estrutural no canteiro em Foz do Iguaçu. Passávamos a noite inteira fazendo este desenho em papel vegetal (20 cm x 20 cm) e, logo cedo, no dia seguinte, enviamos uma pessoa de avião (São Paulo – Foz do Iguaçu) para entregar o desenho em mãos. Naquele tempo, esse era o maior exemplo de proatividade, agilidade e capacidade de execução. Hoje esse problema se resolveria em poucas horas com o uso de um laptop ou smartphone. O mundo mudou e, como diria, Darwin: “se adaptar é essencial”.

Para o nosso segmento, este mundo digital, apresenta um novo cenário de possibilidades e soluções. Hoje cada profissional, organização, associação e parceiros estão conectados às plataformas digitais e isso nos obriga a evoluir a no planejamento estratégico da educação corporativa nas companhias de saneamento sejam estaduais, municipais ou privadas.

Desde 2010 venho acompanhando este processo de mudança pelo mundo, em dezenas de viagens por países da América Latina, Europa, Ásia e África, como Governador do Conselho Mundial da Água no processo de divulgação do 8º Fórum Mundial da Água, realizado em Brasília, em março deste ano.

Deste rico e longo cenário de observações, tornou-se claro para mim que não é suficiente para o setor de saneamento no Brasil apenas ter um ambiente jurídico-institucional estável, capaz de atrair os investimentos necessários para a universalização dos serviços. Precisamos formar, capacitar e qualificar os profissionais do setor, para garantir a gestão de suas operações dentro de padrões de excelência. Para que a revolução do conhecimento ocorra, ou seja, a evolução da educação corporativa nas empresas do setor de saneamento básico, precisamos incorporar e rever alguns conceitos que descrevo a seguir:

  • Todo processo de aprendizagem é multimídia e se dá por meio de múltiplas plataformas. Aprendizados intensivos, de curta duração, direcionados para m-learning, aprendizados de média duração utilizando e-learning e aulas presenciais que permitam a aplicação do “aprender fazendo”. O planejamento equilibrado entre estes três processos é fundamental;

  • Destaca-se que outro ponto deste desafio é a necessidade de revisitarmos alguns conceitos essenciais tão presentes no contexto educacional atual, pois apesar da similaridade entre os termos e de muitas pessoas considerarem o m-learning apenas como subcategoria do e-learning, estes modelos de ensino tem diferenças consideráveis, na entrega, no conteúdo, contexto de aplicação e abordagem;

  • Cabe aqui uma reflexão ou, posso dizer, uma recomendação sobre qual o público alvo interno que deve ser eleito para que se inicie a implementação dos novos conceitos digitais. A partir das experiências vivenciadas, sem nenhuma dúvida, é o nível operacional o chamado “chão de fábrica”. Em média representam 70% dos quadros de funcionários de uma operadora e posso afirmar, que com raras exceções, que nunca tiveram a devida atenção em programas de educação corporativa. Composto em sua maioria por pessoas jovens, com baixo nível de escolaridade e pouco conhecimento técnico do setor. Essa gama de trabalhadores são os que respondem mais rápido aos novos estímulos, mais dinâmicos, envolventes e interativos, que devem estar presentes nestes novos formatos de capacitação.

Ao longo deste caminho iniciado em 2010, encontrei parceiros, cada um com sua experiência na área de educação corporativa, que muito me ajudaram a materializar este meu sonho em um processo viável, organizado e disponível para o mercado do saneamento. Contamos hoje com 18 treinamentos de curta duração, com 8 horas cada, focados no “chão de fábrica”, que foram estruturados a partir das reais necessidades detectadas por uma equipe de engenheiros de operação, consultores e fabricantes para atender as necessidades do mercado brasileiro. Além da estruturação do curso, também deram suporte para a formação de instrutores alinhados com a filosofia HYDRUS.

Em 2016 nasceu oficialmente o HYDRUS BRASIL, que reúne associados e parceiros nacionais e internacionais, dentre os quais não poderia deixar de destacar Office International de l´Eau (OIEau), Prefeitura Municipal de Piracicaba (PMP), MUVE Digital e a Academia AEGEA. Com a qual, no processo de parceria, capacitamos dentro da filosofia e conceitos expostos aqui, desde novembro de 2017 até agosto 2018, 600 profissionais com treinamento prático e presencial, em operações nas cidades de Piracicaba, Matão, Holambra, Vila Velha, Teresina, São Francisco do Sul, Penha, Camboriú, Bombinhas e Primavera do Oeste. Iremos atingir, até dezembro deste ano, 1.000 pessoas treinadas e capacitadas.

Nosso planejamento para 2019 é a implementação de cursos digitais, com a certeza de que migrar o Saneamento para a era HIPERDIGITAL, oferecendo formação adequada aos colaboradores, é a nossa contribuição para modernizar todo o processo de gestão, aumentando a eficiência, a governança e os resultados de nossas companhias de saneamento.

*Newton de Lima Azevedo é presidente do conselho do Hydrus Capacitação e presidente da Lima Azevedo Engenharia e Consultoria Empresarial. É engenheiro civil formado pela Escola Politécnica de São Paulo. Iniciou sua carreira na Themag Engenharia. Nos últimos 25 anos presidiu empresas nacionais e internacionais de saneamento. É membro do Comitê Executivo da Aquafed – The International Federation of Private Water. De 2011 a 2017 foi Governador do Conselho Mundial da Água.