Ação civil pública contra Syngenta por dano ambiental

06/07/2024
AGU pede que a empresa seja condenada a reparar os danos ambientais causados por produtos adulterados, além de eventuais indenizações.

A Advocacia-Geral da União (AGU) ingressou, na Justiça Federal de São Paulo, com ação civil pública por dano ambiental contra a Syngenta, multinacional de defensivos agrícolas, pela produção e comercialização de agrotóxicos adulterados de forma irregular. Na ação, a AGU pede que a empresa seja condenada a reparar os danos ambientais causados pelos produtos adulterados, além de pagar indenização pelos danos morais coletivos e pelos danos derivados da exposição ambiental indevida ao produto tóxico. O valor das indenizações deverá ser apurado no curso do processo. A Justiça solicita ainda o bloqueio de valores da empresa como forma de garantir a futura reparação dos danos, no montante de R$ 90 milhões caso a Syngenta não apresente garantias, além da suspensão de acesso a financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito.

A AGU pede, também, a tutela de urgência para obrigar a Syngenta a identificar, recolher e dar destinação adequada aos produtos comercializados ainda não recolhidos e, por fim, que a companhia apresente um plano de integridade ambiental em 90 dias e divulgue em seus sites e redes sociais informações sobre a ação e as decisões judiciais proferidas, além de expor em seus relatórios e programas de sustentabilidade informações sobre a adulteração dos agrotóxicos objeto da ação.

A atuação é baseada em fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que constatou o uso do conservante bronopol em níveis quase três vezes acima da quantidade autorizada na produção do agrotóxico Engeo Pleno. O produto também foi ilegalmente adicionado aos produtos Karate Zeon 250 CS e Karate Zeon 50 CS, que sequer previam a utilização de bronopol na fórmula. Os pesticidas são utilizados em diferentes tipos de culturas agrícolas. A empresa produziu 4,7 milhões de litros dos produtos, dos quais ao menos 4,4 milhões chegaram a ser comercializados, conforme apontado em autos de infração do Ibama que foram juntados à ação. O Ibama estima que a comercialização dos produtos adulterados gerou mais de R$ 400 milhões de receita para a empresa.

O bronopol é um conservante de ação bactericida e que em altas quantidades pode resultar em uma maior toxicidade do produto e, portanto, em um maior risco advindo do seu uso. Uma nota técnica do Ibama juntada à ação alerta que a Agência Europeia dos Produtos Químicos, órgão regulador da União Europeia, classifica o bronopol como muito tóxico para a vida aquática e alerta que o produto pode causar sérios danos oculares, irritação de pele e irritação respiratória. "A inclusão aleatória e experimental de bronopol em agrotóxicos, à míngua de qualquer estudo prévio e sem qualquer critério técnico, gera ainda maior repulsa e determina níveis de dano ambiental probabilístico em teor imensurável", resume trecho da petição.

O Ibama encontrou documentos na Syngenta que apontavam que a empresa precisou reembolsar clientes que devolveram os pesticidas em razão de sua contaminação microbiológica, que provocava o estufamento das embalagens. A maior concentração de bronopol seria uma forma de evitar o problema devido ao seu efeito bactericida. Durante fiscalização em fábrica da Syngenta, foi encontrado o registro feito por funcionários da empresa de que teriam recebido ordens para retirar os insumos da linha de produção dos agrotóxicos em razão da visita dos agentes do Ibama, numa tentativa de burlar a fiscalização. Em audiência de conciliação no processo administrativo aberto pelo órgão ambiental, a empresa reconheceu a adulteração do agrotóxico. Na ação, a AGU ressalta que a conduta da multinacional indica que ela estaria praticando o chamado greenwashing, que consiste em se apresentar à sociedade como uma empresa ambientalmente responsável apesar de manter práticas que provocam danos ambientais.
A ação é resultado de uma atuação conjunta de diversas unidades da AGU, entre as quais a Procuradoria-Geral da União (PGU), a Procuradoria-Geral Federal (PGF), a Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente (Pronaclima) e a Procuradoria Federal Especializada junto ao Ibama (PFE/Ibama). "O ajuizamento da ação civil pública em razão da adulteração e comercialização de agrotóxicos ilegais pela multinacional ré expressa o compromisso da AGU e do Ibama com a sustentabilidade e a responsabilidade ambiental. Aplicou-se ao caso precedentes internacionais, assim como imputações de responsabilidade pela violação das normas de prevenção e precaução. A ação visa à gestão de risco assim como à destinação adequada dos produtos ilegais, com condenação da empresa inclusive pela prática de greenwhasing", destaca o coordenador de Assuntos Estratégicos e Responsabilidade Civil da PFE/Ibama, Marcelo Kokke.

A chefe da Divisão Nacional de Meio Ambiente e Patrimônio Histórico da Subprocuradoria de Contencioso da PGF, Gabriela Ayres Furtado, ressalta a importância da atuação da AGU em defesa do meio ambiente. "A AGU vem desenvolvendo um trabalho de vanguarda na apresentação e consolidação de novas teses jurídicas que visam não só a reparação integral do dano ambiental, como também evitar a continuidade das atividades ilegais", afirma. Para o coordenador-geral de Patrimônio e Meio Ambiente da PGU, Erick Magalhães Santos, não há dúvidas de que houve falhas na política de integridade da empresa. "Os fatos apurados pela administração pública são bem graves, uma vez que se verificou que a empresa ré, importante no setor de defensivos agrícolas, provocou danos ao meio ambiente em razão de falhas em suas políticas internas de integridade e na comunicação de seus compromissos ambientais", completa.